sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Para os dias de setresse

Não é a primeira vez que recomendo aos meus amigos e amigas uma fórmula que comigo resulta sempre quando estou em baixo.
É o refúgio na cozinha, o meu elevar de moral porque sempre penso que vou inventar qualquer coisa. Tem além disso variadíssimas vantagens: a Ginástica braçal e abdominal do abre/fecha a porta do frigorífico e o abaixo/acima à procura do que nem sei quê.

Por isso, a minha regra começa pelo que tenho a certeza do que quero: A loirinha na prateleira superior. Aí começa a elevação da moral, embora por vezes aconteça uma pequena recaída só porque não encontro o abre-sameiras.

Para os não portuenses, explico, a sameira é aquela carapuça das garrafas da cerveja, que no meu tempo de menino também cobriam as Águas-Castello, as minhas preferidas, (as sameiras, não as águas) que depois de devidamente artilhadas com casca de laranja, davam uma guita do caraças nas corridas das bordas dos passeios.

Este foi - é - um pequeno àparte saudosista. Quem gostar de pormenores é só perguntar. Qualquer portuense com mais de 60 anos dará uma resposta.
Vamos ao que interessa. No sábado passado eu, mim, moi memme, estava ancioso. O Sportingue sem o boxiste Sá Pinto mas com o uesterlingue Oceano, obrigou-se  num contrato e numa disciplina à sua escolha, a apresentar-se no Palco do Dragão com um grupo de lutadores, no domingo seguinte.
A exibição grandiosa teria como parteneres um grupo de chavalos, comandados pelo El Comandante e seus muxaxos O Maçã Podre, O El Bandido, O Poderoso, etc. e tal.

Como a viagem era longa, talvez para evitar o desgaste dos lutadores e precavendo, quiçá, uns furos na zona da Vila da Feira, a Administração Petrolífera de Alvalade resolveu despachar a comitiva de avião. Pelo menos foi o que se me constou.

Mas então o porquê do meu setresse? Pela incógnita se, depois da exibição, sobrariam alguns parteneres Dragãoenses em condições psico-somáticas-atléticas para exibições futuras. E como sou de previsões, O Poderoso passado 5 minutos do começo da exibição uesterlinge já estava de saída com uma perna ao peito. E como diria o Mourinho, o nambere one, son cousas de la vida nuestra. Qui fazieri..

Mas isso foi só no domingo e ainda estavamos no sábado. E o setresse a ferver.
Redegrindo, estava na cozinha olhando para uma tigelada de frutas e pensei: Se um mestre cozinheiro faz compota de pera que ninguém entende, porque não posso fazer o mesmo ?
E assim começei bebirrando a loirinha, descascando e cortando as frutas aos pedaços: Peras, Maçãs, Ameixas, Uvas Trincadeiras e Marialvas, Laranjas, Pessegos com e sem pelo, enfim, tudo para dentro de uma panela em camadas, que se separei com umas colheres de açúcar branco, mas pouco por causa da diabetes.


Para melhorar o possível paladar final, nada como uma pitadinha de gengibre e um pau de canela. Mas pelo sim, pelo não, uma colher de chá de canela em pó não vai estragar nada, nem o sumo (olá irmãos do Atlântico Sul, sumo é suco, não aquela luta gordorenta de gigantes) de um limão e a casca de uma laranja, cortada fininha sem a tripa branca. É o toque final de mestre.

Dito é feito, deixar ferver, mexer com a colher de pau (sou conservador nos utensílios de cozinha bem como na ortografia (falada) e na fonografia (ouvida). Tudo disparates como um cozinheiro sem pédigri. Mas siga e prontos.

Um pouco de água para amaciar o produdo fervente, só a cobrir o dito e a matéria vai-se dissolvendo. Se demorar muito, porque o setresse aperta e a paciencia esgota (nunca mais era domingo) mete-se a varinha mágica lá dentro que vai ajudar a dissolver o que não quer ser dissolvido. Convém retirar o pau-de-canela porque pode dar azar. Mas tem de ficar o produto grosso, a sentirem-se os fiapos e os gromos pequenininhos da fruta. Enfim, se estiver ainda muito grosso e pegagento, acrescentar só um pouco de água, deixar ferver, e aí desliga o lume e nem mais um toque ate arrefecer completamente.

Não disse que não se podia ir provando durante o equilíbrio setressante. Com efeito, talvez até seja conveniente, mas bufando como às pápas na colher da prova, porque a coisa escalda e se não tivermos a língua apurada de finesses saem umas palavrinhas iguais às que a rapaziada do uesterlingue do seportingue irá ouvir no domingo.

Mas domingo já foi, o estresse foi diminuindo, o espectáculo correu como o previsto - 14 cartões amarelos por falta de desportivismo para o Seportingue, dois para os Dragõens a pedido do público, para equilibrar, e vamos à prova da moenga como diriam os meus queridos compadres Canhão e Leonardo.

Torrar um pão, neste caso e porque era domingo, a qualidade era regueifa, meter-lhe em cima umas colheradas da dita compota e porque a gurmeteria manda - e eu aproveito para homenagear os meus queridos amigos Ze Câmara e o Tobias, e todos os Açoreanos espalhados pelo mundo -, um queijo das Ilhas dos Açores, neste caso de S. Jorge, que de vez enquando gosto de sentir nestas mandíbulas sem dentes naturais.

E mai'nada, prontos.

Nota do autor: A linguagem e pronúncia do Norte é muito linda, penso eu de que. Está em preparação a sua candidatura a património da Humanidade. Apoiem-na.   





quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Dia Mundial do Professor

É amanhã, 5 de Outubro, que se comemora este dia.

Lembro-me com muita frequência da minha primeira professora, a Senhora D. Belmira, que me "fez" toda a Primária e dos seus olhos chorões quando se despediu de mim no ano em que fui operado, fiz a 4ª classe e a Admissão ao Ensino Preparatório. Ainda não tinha 10 anos.
Se não fosse ela, o meu gosto pela Matemática, pelo Português, pela História, pela Geografia, pela Leitura, provàvelmente não teriam sido os mesmos.

Certo, meu Pai foi outro mestre, não que me obrigasse a ser "marrão" ou "perdesse" muito tempo a ensinar-me. Mas há exemplos e conversas gravadas no nosso sub-consciente e lá ficam até ao dia em que nos recordamos delas. E os seus livros e jornais que me deixou ler foram um estímulo e complemento.

Durante a minha vida de estudante-saltimbanco encontrei outros professores marcantes e de histórias que ficaram gravadas. Como acabar com a simbólica e antiga praxe da greve geral no dia de S. Martinho da Oliveira Martins. Porque era do contra... qualquer coisa.

Na área de matemática uma professora deu-me 19 valores num exercício. Na sua correcção, o único erro assinalado não conferia com a minha opinião. Disse-me, tinha de arranjar qualquer coisa para não lhe dar o 20, pois assim seria considerado como sabendo tanto quanto eu. Aceitei perfeitamente.
Não sei quando, mas vim a saber que essa professora era irmã de um dos genros dos meus patrões. Mas não foi com "cunhas" que fui passando de ano. As minhas médias eram de 17 e levei com um 13.

Ainda nesta área, num dos anos fui explicador dos restantes companheiros. O centro de estudos era no Café do Bonfim ou aos sábados à tarde no Rialto. Curiosamente, com excepção de um colega, todos dispensaram da oral... menos eu. E a sala encheu para ver a minha prova, que quando entrou na Geometria, pedi dispensa porque não percebia nada do tema e nem tempo tive para estudar. O júri deu-me a nota positiva mais baixa do curso.
Claro que só foi possível ajudar os colegas porque os professores de outras disciplinas nos davam dispensas das suas aulas.

No último ano de francês, disciplina que nunca acabei embora com média final para exame -foi o medo de uma reprovação humilhante - tive um conflito com o professor Vaz, discordando do seu método de ensino. Trazia dos anos anteriores média de 14 e não havia maneira de me entender com ele. Um dia, irritado por causa de um 8, disse o que sentia e pensava dos métodos dele, como professor.
Todos os companheiros que assistiram à conversa foram de opinião ser melhor desistir do ano, pois consideravam já o ter perdido. E não se sabia se não iria ter um processo disciplinar. Que nunca aconteceu e continuei a frequentar as aulas.

No final do ano, preparo-me para o exame de Português. A minha média era elevada, não me lembro de quanto mas que mantive na prova escrita. A oral era obrigatória. Assisto a vários exames, anoto as características das perguntas e os autores que são de preferência do júri, três professores sendo um deles o Prof. Vaz, de francês. Na véspera do meu exame, o sorteio deu como último a interrogar o Prof. Vaz. Pediu Damião de Góis. Segui o exame do companheiro, abri o meu livro e fui fazendo anotações nas margens.
No dia do meu exame, jogava-se o Portugal-Brasil para o Mundial de 1966. Só vi um pouco do jogo enquanto lanchava no meu "tasco" preferido, o Onix, e segui para a Escola.
Na hora do começo dos exames faltava um elemento do júri. O Professor Vaz. Casado com uma brasileira, segundo explicou depois, teve uma discussão em grande lá em casa por causa do jogo (vitória de Portugal por 3 ) que o atrasou. Já tinha sido combinada entre os outros dois elementos a ordem dos exames. Eu seria o segundo. No momento em que chega a minha vez, entra o Prof. Vaz e pede que seja alterada a ordem, ficando eu para ele. O terceiro. Chegado o momento, diz-me, abre e lê o Damião de Góis. Mais umas tantas perguntas e acaba o exame.

Estava no átrio à espera dos resultados e senti um pontapé no fundo das costas. Voltei-me furioso e dou com o Prof. Vaz que me diz "reprovei-te porque não sabes nada".
Claro que passei. Mas não gostei da nota miserável.

Tudo isto vem ao caso porque gosto de lembrar os professores a quem muito fiquei a dever. Claro que nas disciplinas técnicas fui sempre um péssimo aluno. Mas ficaram  recordações. Principalmente da minha Professora Primária, a D. Belmira.

Este escrito é a minha homenagem aos professores, lembrando especialmente aqueles por quem passei nas mãos. Não foram só Professores, mas pessoas humanas que me deixaram exemplos para recordar
Hoje, não faço ideia de como é o ensino. Com tantas polémicas, descoordenações, reuniões, papeis para preencher, e que tempos de aula ? é um mundo onde ninguém se entende, com pais agradecidos outros revoltados, alunos bonzinhos e uns tantos que só à bofetada deveriam ser tratados. E os Professores, pessoas, que têm a dizer ?
Não sei se os seus salários compensam esta actividade desorganizada, ao sabor de tantos interesses e políticas, algumas sem jeito que mesmo quem não é da "arte" entende. Não sei se há bons e maus professores. Mas sei que sem eles seríamos analfabetos.

Um abraço de carinho a todos os Prof's. Em especial aos que me dão a sua amizade e são muitos, quer estejam no activo ou como eu a gozar a boa da vida...
E particularmente à amiga Maria Helena Leote, que amanhã completa mais um ano de vida.
Parabéns a você, Amiga. (Ainda não completei a leitura do seu livro...)

Por casualidade, no sábado passado fui dar a uma Escola. Dizia um companheiro era aqui a minha carteira. Por muito velho que estejamos, os nossos verdes anos passados na Escola serão sempre relembrados.
Mesmo que a cana ou a palmatória, na altura, nos tenha doído.