terça-feira, 21 de outubro de 2008

O Alentejo e os Alentejanos

Foto pesquisada na net
Como dizia um velho mestre e amigo, a gente com a idade "vareia". Não sei se faz parte da língua portuguesa esta palavra, mas eu entendia-o. E é verdade.
Últimamente tenho visto e lido muita coisa sobre o Alentejo. Então saltou-me à memória o primeiro dia em que pousei pé nessa terra que, digo agora, infelizmente pouco conheço. Foi no já longíncuo ano de 1967, precisamente no dia 24 de Junho, que desci do comboio em Vendas Novas, vindo das Caldas da Rainha. Tinha acabado a primeira fase do curso militar e ali cheguei para completar a segunda. Contava com um fim de semana em casa, passar o S.João, o que nao aconteceu. Então o Alentejo a partir daquele momento passou a ser o meu inferno. Até porque deveriam estar uns 30 e muitos graus. Um calor abafado, seco, que a viagem no comboio tinha piorado. Claro que o Alentejo não teve culpa de maior, pois ela era da tropa. Mas que foram 11 semanas duras, lá isso foram. E que não me deixaram recordações - pensava eu então -.
Quando regressei a casa, em meados de Setembro, dizia mal de tudo. Meu pai que passou alguns anos em terras alentejanas, disse-me: Um dia ainda terás saudades.
Ao longo da vida militar fui encontrando alentejanos mas de dois em especial, me lembro com saudade: O Canhão e o Leonardo. Encontramo-mos a primeira vez em Paramos, ali próximo de Espinho onde fomos colocados para dar a nossa primeira recruta a soldados. Ambos de Borba, tinham em comum a característica da pronúncia. Quanto ao resto, eram totalmente diferentes. O Leonardo, um homem forte, alegre, sempre bem disposto, amigo de toda a gente. Triste ficava por a sua terra ser a três centenas de kilómetros e não haver transportes que o pudessem levar e trazer a tempo e horas. Creio que nos 4 meses que estivemos juntos, foi uma única vez de "fim de semana". E no Natal. Lembro-me que lhe "matei" o serviço, porque infelizmente bateu naquela data.
O Canhão era o "máximo". O maior desenfiado que conheci. Baixote, com um rosto grande escuro, nariz enorme, cabelo encrespado, costas curvadas, voz cava, arrastada, monocórdica, a sua vida era feita em Espinho, onde conheceu, se não todas, quási todas as raparigas da cidade. Quando foi mobilizado, tinha um livro de moradas enorme e acredito que se tenha correspondido com elas todas. Aliás casou com uma espinhense, e viveu - se é que ainda não vive - em Espinho, onde fez a sua vida profissional depois da desmobilização, num banco.
Com ele me cruzei várias vezes em Bissau. Nunca estive aquartelado na cidade, só de passagem, por várias razões. Mas ele também não. Vinha desenfiado da unidade onde estava a 30 km de Bissau, em pirogas, de boleia, à civil ou vestido "à militar". Não sei como o conseguia mas sei que nunca foi apanhado. Encontrei-me várias vezes com ele no Porto e recordavamos esses tempos, bebendo uma cerveja. Mas nunca adiantou muito às suas estórias.
No verão de 1972, consegui fazer uma viagem de férias por Portugal. Ponto assente, teria de ir ao Alentejo. Sentia saudades daquelas planícies, da cor, das "pequenas" colinas que tantas vezes subi e me pareciam enormes, sem fim. E são. Quem diz que o Alentejo é plano não sabe o que diz. Claro que fui a Vendas Novas, depois de ter passado o cruzamento de Pegões e dei um saltinho a espreitar a Cabrela; segui para Évora e encantei-me com as suas relíquias históricas; Passei por Vila Viçosa, Estremoz e as suas pedreiras de mármores, dormi em Elvas. Aí lembrei-me de outro amigo, sargento do pelotão Daimler que esteve na Guiné comigo. E claro, fui beber um copo de tinto numa tasca de Borba. Se conheciam o Canhão e o Leonardo ? Claro que sim. Falaram-me deles e da família. Gente boa. Os Alentejanos. E o Alentejo. Que saudades. Bem dizia meu pai: Ainda vais ter saudades...




Imagem reproduzida a partir duma prova e feita em meados dos anos 90




1 comentário:

Anónimo disse...

Bateu a saudade no fundo da alma...
gente boa e lugar bom nunca agente esquece..leio bastante a respeito do Alentejo ,sempre esto a visitar espaços ,que trazem alguma informação,alentejana.